quarta-feira, 2 de novembro de 2022

A queda global do mercado imobiliario – Por Beatriz Canamary

No terceiro trimestre deste ano, o PIB dos Estados Unidos cresceu a uma taxa anual de 2,6% depois de uma queda no primeiro semestre. A maior contribuição para esse aumento foi o comércio internacional, em virtude de os EUA estarem exportando mais petróleo e gás natural à Europa, em função da guerra na Ucrânia. Porém, tal crescimento parece não refletir à realidade que se espera para os próximos trimestres. O s gastos do consumidor interno, principal motor da economia, cresceram, mas a um ritmo bem mais lento do que no trimestre anterior. Investimentos residenciais caíram a uma taxa anual de 26,4% e os rendimentos do Tesouro também apresentaram queda.

Parte da desaceleração econômica deste ano reflete um retorno a uma taxa de crescimento mais normal depois que a economia no ano passado se expandiu a um ritmo incomumente rápido de 5,7%, à medida que se recuperava da crise da pandemia.

A incerteza econômica está crescendo e muitos economistas estão preocupados com a possibilidade de uma recessão nos próximos 12 meses, devido aos esforços do Federal Reserve para combater a alta inflação, com elevação das taxas de juros.

Mas os EUA não são a única parte do mundo que enfrenta desafios econômicos. O Banco Central Europeu elevou nesta última semana sua taxa básica de juros de 0,75% para 1,5%, uma vez que também tenta conter a inflação em uma região à beira da recessão.

E um dos setores mais sensíveis às taxas de juros – o imobiliário – está mostrando seus sinais de crise.

À medida que os bancos centrais avançam para conter a inflação, elevando as taxas de juros no ritmo mais rápido em pelo menos quatro décadas —o mercado imobiliário sofre um forte impacto negativo.

Os preços de imóveis estão caindo substancialmente sobretudo nos mercados mais superaquecidos. No Canadá e na Suécia, os preços de imóveis caíram mais de 8% desde fevereiro; na Nova Zelândia, caíram mais de 12% desde o seu pico no ano passado. E nos Estados Unidos e Reino Unido a tendência segue semelhante. Diversos outros países estão indo na mesma direção.

A comercialização de imóveis também apresentou queda. Nos Estados Unidos, as vendas de imóveis caíram um quinto em agosto, em comparação com o ano anterior.  Na Nova Zelândia, as vendas trimestrais foram as mais fracas desde 2010 nos três meses até junho. As ações de grandes construtoras britânicas caíram pela metade este ano e ações das duas maiores construtoras dos Estados Unidos, Dr. Horton e Lennar, caíram mais de 30%.

Isso representa o fim de um longo boom do mercado imobiliário na década subsequente à crise financeira global de 2007-09, quando as taxas de hipotecas e a oferta restrita alavancaram um

aumento constante dos preços de imóveis no mundo desenvolvido. Nos Estados Unidos, por exemplo, os preços, subiram quase 60% em 2012 até o final de 2019.

Então veio a pandemia, durante a qual os preços dispararam. Nos Estados Unidos, Canadá e Holanda, os preços de imóveis chegaram a subir mais de 30% em 2020. Os lockdowns e o trabalho remoto aumentaram a demanda por propriedades residenciais. Os governos, preocupados com uma crise habitacional com a expansão do COVID, concederam temporariamente benefícios ou removeram regulamentos hipotecários para facilitar a compra de imóveis.

No atual momento, com o aumento das taxas de juros as taxas hipotecarias chegaram a níveis não vistos há décadas. Nos Estados Unidos, um ano atrás, a taxa fixa hipotecaria de 30 anos estava abaixo de 3%. Hoje está em 7%. Na Nova Zelândia, as taxas de hipotecas passaram dos 7% pela primeira vez em oito anos; na Grã-Bretanha, o empréstimo médio de cinco anos de taxa fixa agora excede 6% pela primeira vez em 12 anos.

Isso dificultará a vida de compradores e proprietários e provavelmente trará consequências políticas e sociais desconfortáveis por muitos anos.

Três fatores determinarão onde o impacto e suas consequências são maiores e mais prováveis.

O primeiro é o recente crescimento dos preços. Mercados imobiliários onde os preços aumentaram desde a pandemia são substancialmente mais vulneráveis ao desaquecimento da demanda.

O segundo fator são os níveis de empréstimos. Quanto maior o endividamento das famílias, mais vulneráveis se tornam os proprietários ao pagamento de hipotecas e à inadimplência. De fato, a dívida das famílias em relação à sua renda é menor do que era à véspera da crise financeira global de 2008 em países como Estados Unidos, Grã-Bretanha e Espanha. No entanto, diversos outros países enfrentam dívida exorbitantes. Isso os torna sensíveis a pequenos aumentos nas taxas de hipotecas. Na Austrália, Canadá e Suécia, as famílias que conseguiram escapar de todo o peso da crise financeira, aumentaram os empréstimos nos últimos anos.

O terceiro fator é a velocidade com que as taxas de juros mais altas são transferidas para os proprietários. O maior risco é para os mutuários em hipotecas de taxa flutuante. Eles enfrentam uma redução imediata de sua renda. No Canadá, as hipotecas de taxa variável representam mais da metade de todos os empréstimos. Na Austrália e na Suécia, eles representam quase dois terços.

Disto isto, todos os fatores para uma profunda crise imobiliária se evidenciam. Desta vez, porém, é provável que ela não seja liderada pelos Estados Unidos, mas pelo Canadá, Holanda, Austrália, Nova Zelândia e Noruega. Na Austrália e no Canadá, os preços podem cair até 14% em relação ao seu pico, um pouco mais do que o esperado nos Estados Unidos ou na Grã-Bretanha, de acordo com previsões de várias empresas imobiliárias. Economistas do Canadá esperam que o volume de vendas do país despenque mais de 40% em 2022-23 — superando a queda de 38% em 2008-09.

A boa notícia é que os bancos estão mais resistentes à essa queda.

Ainda assim, a crise de moradia terá profundas consequências. O ciclo habitacional é um ciclo de grandes negócios e crescimento da economia. A desaceleração do mercado imobiliário precedeu oito das últimas dez recessões na América. A ligação entre os dois ciclos surge porque a habitação confere “efeitos de riqueza” aos proprietários. Quando os preços das casas sobem, as pessoas se sentem bem com sua situação financeira, então captam mais empréstimo e gastam mais. Quando caem, as pessoas apertam os cintos. Em 2019, uma pesquisa do Banco da Inglaterra constatou que um aumento de 10% nos preços das casas eleva o consumo em 0,35 a 0,5%.

Outro canal importante entre o mercado imobiliário e o resto da economia é o investimento. Os gastos de capital associados à habitação, especialmente a construção de casas, podem ser extremamente voláteis. De fato, a queda do investimento residencial representou um terço da queda do PIB americano em 2007-09. Na Grã-Bretanha os resultados foram semelhantes. Construtores de casas perseguem booms. À medida que as preocupações aumentaram, as construções nos Estados Unidos caíram esse ano 20% desde abril.

E o maior efeito de uma crise imobiliária pode estar na política. O aumento das taxas de juros terá repercussões políticas imprevisíveis, sendo muito provável que governos implementem enormes operações e estratégias políticas para resgatar o aquecimento do mercado imobiliário.

*Artigo de Opinião – Por Beatriz Canamary, Mestre em Engenharia Civil (UFC), especializada em Fusões e Aquisições (Harvard Business School), doutoranda em Administração de Negócios (Rollins College, EUA), Membro do World Economic Forum e da Academy of International Business.

O conteúdo não reflete, necessariamente, a opinião do ENB.

 

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