quinta-feira, 9 de junho de 2022

Os principais cuidados tributários que devemos ter no falecimento de um ente querido

*Artigo de Opinião Por Fernanda do Nascimento Pereira

Passar pela morte de um familiar, por si só, já é um grande desgaste emocional, pois lidar com o luto é algo que nunca estaremos preparados para lidar.

Acontece que, além de todo o desgaste emocional natural do falecimento de um ente querido, os familiares sobreviventes precisam lidar com diversas outras questões, desde os gastos com velório às discussões sobre a divisão dos bens e questões burocráticas, como a declaração final do imposto de renda do espólio e algumas operações que envolvem, inclusive, o pagamento de impostos.

Em um momento tão delicado, é muito importante uma boa assessoria para que esse momento não acarrete maiores problemas ou até pagamento indevido de tributos.

Diante disso, trazemos aqui alguns dos cuidados que precisam ser tomados pelos familiares sobreviventes.

Em primeiro lugar, é preciso ficar atento às regras específicas para declaração do imposto de renda dos bens em nome do falecido. Isto porque, para a Receita Federal, somente a decisão judicial ou a escritura pública de inventário e partilha extingue a responsabilidade tributária da pessoa falecida. Isso significa dizer que apenas após a formalização mediante decisão judicial ou escritura de pública de inventário é que dissolvida a universalidade de bens e direitos, ou seja, que é considerado que o falecido deixou de ser o proprietário dos bens que foram transferidos aos seus herdeiros.

Nesse sentido, a Receita Federal faz a seguinte distinção entre as declarações de imposto de renda após o falecimento.

Declaração Inicial

Corresponde ao ano-calendário do falecimento

Declarações Intermediárias

Referem-se aos anos-calendário seguintes ao do falecimento até o ano-calendário anterior ao da decisão judicial da partilha, sobrepartilha ou adjudicação ou da lavratura da escritura pública de inventário e partilha

dos bens

Declaração Final

É a que corresponde ao ano-calendário da decisão judicial da partilha, sobrepartilha ou adjudicação ou da lavratura da escritura pública de inventário e partilha dos bens. Essa declaração corresponde ao período de 1º de janeiro à data da decisão judicial ou da lavratura de escritura pública de inventário e partilha

Cumpre destacar que a apresentação da Declaração Final de Espólio é obrigatória sempre que houver bens a inventariar.

É muito comum acharem que a Declaração Final de Espólio só deve ser entregue no “final”, quando todos os bens tiverem sido destinados aos herdeiros, o que não é verdade.

Tal declaração pode e deve ser enviada mais de vez, dado que a declaração é considerada como final no ano em que houver a decisão judicial ou lavratura da escritura de inventário, sendo possível que nesse mesmo ano calendário ainda haja bens a serem transferidos aos sucessores, o que fará com que seja enviada uma nova declaração quando formalmente realizada a transferência dos bens restantes.

Além dos cuidados no envio da declaração do imposto de renda, é importante a atenção a algumas situações em que o Fisco, tanto federal, quanto estadual, cobram tributos indevidamente no momento de transferência dos bens aos herdeiros em razão da sucessão causa mortis, quais sejam:

  • ITCMD em caso de residente fiscal ou ativos situados no exterior:  Cobrança de ITCMD, tributo que normalmente varia entre 4% a 8% do valor de mercado do bem, sobre a sucessão causa mortis de bens que o falecido possuía no exterior ou quando o inventário foi processado no exterior ou quando este era residente e/ou domiciliado no exterior. Sobre o assunto, o STF já decidiu pela inconstitucionalidade dessa cobrança. Entretanto, como houve a modulação dos efeitos da decisão que determinou a inconstitucionalidade do ITCMD, o imposto não pode ser cobrado nas transferências que ocorreram a partir de 20 de abril de 2021. Vale ainda mencionar que na primeira semana de junho de 2022, o STF também decidiu que o Congresso Nacional tem 12 meses para elaboração da Lei Complementar Federal, o que viabilizará os estados a cobrarem o ITCMD sobre essas transferências de bens no exterior.
  • Não incidência do ITCMD no recebimento de VGBL: O entendimento majoritário dos tribunais é no sentido de que o imposto não deve ser pago quando a transferência dos valores é realizada aos beneficiários em decorrência da morte do segurado. Este tema, inclusive, teve repercussão geral conhecida pelo STF em maio de 2022, que irá decidir de forma definitiva sobre o assunto.
  • Não incidência do Imposto de Renda – IR sobre os rendimentos do VGBL: A Receita Federal, de forma equivocada, veda o direito à isenção do Imposto de Renda sobre os rendimentos acumulados no seguro de vida VGBL, quando a transferência dos valores é realizada aos beneficiários em decorrência da morte do segurado, trata-se de assunto que já tem decisão favorável no âmbito judicial. A economia é de aproximadamente 15% sobre todo o rendimento acumulado no VGBL.
  • Retenção do IR na transferência de fundos de investimento fechados: É muito comum verificar a retenção indevida do IRPF sobre a sucessão causa mortis de fundos de investimento fechados. Em razão da complexidade da tributação incidente sobre os fundos de investimento e da diversidade de investimentos existentes no mercado, trata-se de situação que deve ser analisada de forma individualizada para verificar se houve retenção indevida do imposto de renda.

Portanto, em que pese o falecimento de um ente querido seja um momento muito delicado, é importante que os familiares sobreviventes fiquem atentos para que os tributos não acarretem na redução indevida do patrimônio construído em vida.

*Fernanda do Nascimento Pereira é advogada na Domingues Sociedade de Advogados (DMGSA) e Especialista em Direito Tributário.

**Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do ENB

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