quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Erro na contabilidade pode abrir precedentes para limitar o acesso ao crédito do setor varejista

A renúncia do então presidente da empresa Americanas S.A. em apenas 10 dias que assumiu o cargo, alegando “inconsistências em lançamentos contábeis” de R$ 20 bilhões no balanço da varejista, ainda movimentam o mercado.

E o como a crise vivenciada pela companhia listada na B3 abala o setor de varejo no Brasil? Wagner S. de Moraes, sócio fundador e CEO da A&S Partners, empresa de negócios voltada para implementação e reestruturação de operações nas áreas de M&A, afirma que o episódio pode sinalizar uma fraude sem precedentes, abrindo margem para desconfiança por parte de investidores, inclusive, com outras operações de varejo.

“A cifra é astronômica, pois representa mais que a metade dos R$ 32 bilhões de faturamento que a empresa teve no ano de 2021. A divulgação desse “erro de contabilidade” reduziu em até 80% o valor das ações da empresa negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo, a B3, e ainda colocou em dúvida a capacidade da companhia em manter as suas operações da forma como está hoje, ou seja, o seu futuro é muito sombrio. Isso abala completamente a sua capacidade de honrar com as suas dívidas, manter os prazos para as suas compras e reposições dos estoques de mercadorias e sem isso, uma companhia de varejo dificilmente conseguirá sobreviver. A situação é gravíssima. A grande dúvida gerada é se as outras empresas do segmento estão tomando todos os cuidados necessários e se também não estão tomando as mesmas decisões erradas na parte contábil e transparência nos números. Um erro desse tamanho é inaceitável, incompreensível e irresponsável. Certamente afetará as outras empresas do setor de varejo, os balanços serão bem mais investigados pelos investidores e instituições financeiras, bem como o acesso ao crédito deverá ser bem mais limitado, o que é muito ruim para o setor”, afirma.

Recuperação judicial e risco de falência

O juiz da 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, Paulo Assed, concedeu uma medida de tutela de urgência cautelar a pedido da Americanas (AMER3). Essa medida adia a obrigação da varejista de pagar suas dívidas até que um eventual pedido de recuperação judicial seja feito à Justiça. O magistrado deu um prazo de 30 dias para que a Americanas peça a recuperação judicial, se avaliar que é o caso.

Moraes ressalta que este ainda não é um pedido formal de recuperação judicial. Há ainda um caminho burocrático a ser percorrido para que a empresa formalize o pedido, como a construção de um plano de negócios para suportar a recuperação judicial que não traga lesão ou riscos a credores, que evidencie a capacidade de pagamento da companhia no cumprimento de suas dívidas e obrigações, dentre outros.

“O próximo passo crucial para a empresa é justamente entrar com esse pedido. Após a sua formalização, ainda haverá um rito processual bastante longo até que seja deferido, como a negociação e manifestação dos credores sobre a aceitação das bases do plano, perícia para verificar a sua factibilidade, tratamento dos ativos, posição de caixa, dentre diversos outros pontos. Nós acreditamos que esse processo ainda deverá levar por volta 12 meses, no mínimo, até que seja deferido dado a complexidade das operações envolvidas”, afirma.

Para o especialista há, sim, o risco de falência. “Existe o risco de falência iminente caso o plano de recuperação não seja aprovado, pois a companhia já está numa posição de insolvência, ou seja, não possui ativos suficientes para liquidar as suas obrigações”.

Custo do descontrole

Há um ano, em 16 de janeiro de 2022, a Americanas valia R$ 27,25 bilhões; Antes do anúncio do rombo bilionário, em 11 de janeiro, a varejista valia cerca de R$ 10,82 bilhões; hoje, a empresa vale R$ 1,75 bilhão

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